Iranduba: a história do time enganado por patrocinador e ajudado pelo rival

O Iranduba, time feminino do Amazonas, está preparado para fazer a sua reestreia no Brasileirão A1 2020. As jogadoras treinaram bastante para este momento e estão ansiosas para entrar em campo. Este é o cenário atual da equipe. Três dias atrás, no entanto, a realidade era completamente outra. O clube não estava treinando e tinha apenas quatro atletas no elenco.

“Desde 2013, quando foi criado o Brasileirão feminino, o Iranduba sempre disputou a primeira divisão, já esteve na semifinal e é o recordista de público no campeonato, com 25 mil pessoas contra o Santos, na semifinal de 2017. É um time que fez muito sucesso de 2016 a 2018, com campanhas históricas, recordes e nunca passou por aperto”, lembra o diretor de futebol, Lauro Tentardini.


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As coisas começaram a desandar quando, em 17 de fevereiro de 2019, o presidente do clube, João Amarildo Dutra, assinou um contrato de patrocínio master com a empresa VeganNation. Nesse acordo, os valores prometidos eram em criptomoedas, que supostamente poderiam ser trocadas por dinheiro em maio daquele ano. Outros três clubes do Norte também fecharam parceria com a empresa nessa época: Paysandu, Remo e Nacional. Três desses quatro nunca viram a cor desse dinheiro.

VeganNation

A VeganNation é uma empresa que promove o veganismo e tem a sua própria criptomoeda, a VeganCoin. Criptomoeda, ou bitcoin, é uma moeda digital, um código digital que pode ser convertido em valores reais, de acordo com o portal Finance One.

O interesse pelo futebol do norte brasileiro surgiu após a empresa arrendar 60km² de terra na Floresta Amazônica para proteger a fauna e flora. Os representantes, então, tiveram a ideia de investir no futebol para ajudar na divulgação do projeto. Essa parceria inclui, mais recentemente, o Vasco e já contava com alguns ex-jogadores, como Cafu, Edmilson e Zico.

O Iranduba nunca recebeu o dinheiro prometido. “Apareceu o Roberto Rosemberg, representante da VeganNation, e falou que as datas eram irreais, que as pessoas (responsáveis pelo contrato com o Iranduba) já haviam saído da empresa e nos enganaram”, conta Lauro Tentardini. Esse representante prometeu que o dinheiro sairia em 30 de março de 2020, mas isso também não aconteceu.

Procurados pelo Metrópoles, o Paysandu alegou que “o contrato foi encerrado por descumprimento de algumas cláusulas”, sem mais detalhes. E o presidente do Nacional, Nazareno Pereira, afirmou que se juntará ao dirigente do Iranduba, João Amarildo, para levar o caso à Justiça. “Conversando com eles eu acho que não vai haver mais condição”, indagou Pereira. O Remo não retornou o contato da reportagem.

Argumentos da empresa

O representante da VeganNation, Roberto Rosemberg, alega só ter entrado em ação depois que a confusão já estava formada, ou seja, não participou da formulação do contrato apresentado e assinado pelo Iranduba. “A VeganNation agiu de boa fé. O problema foram as pessoas que fizeram o contrato.”

“Eu não entendi porque fizeram proposta para o Iranduba. Infelizmente, eu vou ter que dizer isso. O Iranduba realmente não é representativo e eu não faria contrato com o Iranduba”, falou Rosemberg.

Roberto alegou ainda que seu nome foi incluído no contrato como se ele fosse intermediário, que ele não sabia disso e, mesmo assim, até hoje também não recebeu a sua porcentagem. “Em agosto, setembro (2019), eu vi que a situação era insustentável. Eu peitei eles, falei para o dono da empresa que eles mentiram, que os clubes foram enganados. Mas eles não tinham como resolver.”

“Eu convenci o CEO da empresa — Isaac Thomas, que assinou o contrato com o Iranduba — a dar um bônus de 50% aos clubes e foi feito um adendo, aumentando o valor e colocando o recebimento para 30 de março de 2020. Eu consegui o patrocínio para o time masculino, que não tinha patrocinador. Os valores que chegaram são estratosféricos, são valores de clubes de Série B, Série A. Só que tudo está parado”, explicou Rosemberg.

O empresário coloca a culpa do atraso do pagamento na pandemia do novo coronavírus. “A China, onde seria feita a troca da moeda, fechou e os diretores ainda não puderam concluir a troca para o pagamento ao Iranduba. A moeda vai sair até dezembro”, cravou.

Porém, o diretor do Iranduba afirma que esse prazo não foi passado para o clube. “O pior de tudo é que eles (responsáveis pela VeganNation) falam que não têm previsão para sair a moeda. Como é que a gente fica nisso daí? Esse é o maior problema de todos.” A maior indagação de Lauro é que as criptomoedas não valem nada se não forem trocadas.

“Essas moedas não têm valor de mercado. Não adianta. Que patrocínio é esse? Se eu contratar alguém e pagar a pessoa com um cheque sem fundo. Esta pessoa será paga com cheque sem fundo? Não!”, esbravejou.

Mão amiga do rival

O estrago foi tanto que o clube ficou sem dinheiro para pagar o salário das jogadoras e perdeu quase todo o elenco. Em contato com o Metrópoles, ainda no dia 25 de agosto, Lauro lamentou ter apenas quatro jogadoras e via o tempo correr contra ele, com o jogo de reestreia marcado para este sábado.

No dia seguinte, saiu a notícia confirmada por Lauro de que o Iranduba e seu rival no Amazonas, o 3B, haviam fechado uma parceria de luxo. O dono do 3B, João Bosco Brasil, sugeriu emprestar todo o elenco, a comissão técnica, além do centro de treinamento e alojamento para as atletas, arcando com os salários e alimentação das atletas.


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“Eu faço essa parceria pelo futebol feminino e, principalmente, pelo futebol amazonense. Eu comecei no futebol feminino sendo dirigente do Iranduba. Mesmo que tenha essa rivalidade, o nosso projeto é ajudar o Iranduba a não cair e dar esperança ao clube”, disse João Bosco. “Eu estou muito feliz. As jogadoras estão super felizes porque nós estamos há quatro meses treinando sem jogar e pra gente vai ser muito bom voltar a jogar. Pra gente é só felicidade”, comemorou.

Agora, depois de tanta correria e dor de cabeça, Lauro pode respirar um pouco e focar as energias em apoiar o Iranduba. “É um grupo muito qualificado, eu conheço bem o time”, disse o diretor sobre as jogadoras que agora integram o elenco do Hulk.

“Nós estamos um pouco atrasados na tabela de classificação e isso acaba atrapalhando um pouco mesmo com toda essa qualidade do time. Mas a expectativa é muito boa. Estou muito animado para o jogo de amanhã e para o restante do campeonato”, confessou aliviado.

O Iranduba, 13º colocado no Brasileirão Feminino, com seis pontos, enfrenta o Vitória, 15º, que ainda não pontuou no campeonato. A partida está marcada para às 20h30, no Barradão, em Salvador, e terá a transmissão da CBF TV.

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